CODEMA DE ITABIRA: Reflexões sobre representação, legitimidade e desafios da cidade.
*Denes Martins da Costa Lott
Na sexta-feira, 11/04/2025, o CODEMA de Itabira foi palco de uma acalorada discussão, tendo como fio condutor a atividade minerária desenvolvida pela Vale na cidade há mais de 80 anos.
O jornal Diário de Itabira estampou em sua manchete: “Bate-boca tenso na reunião do CODEMA”. Já o site Vila de Utopia destacou: “Xenofobia e falta de decoro encerram reunião do CODEMA antes da conclusão da pauta”.
O ponto central do debate foi o pedido da empresa Vale para obter anuência do conselho visando ao licenciamento da ampliação de sua atividade minerária no município. Um pedido que, à primeira vista, parece contraditório: a mesma empresa que pleiteia expansão, afirma em outros fóruns que restam apenas 16 anos de reservas minerais em Itabira.
Essas contradições não são novidade — fazem parte do próprio DNA da mineração. E, como de costume, estão envoltas por um elemento inevitável: política. Não no sentido partidário, mas no seu sentido mais cru e realista: interesse. O CODEMA é um espaço onde interesses se enfrentam — e isso precisa estar claro para quem acompanha ou participa.
Falo agora não só como advogado, mas como cidadão itabirano e ex-secretário de Meio Ambiente, cargo que ocupei por quatro anos. Conheço de perto as nuances e as tensões que atravessam os conselhos municipais de meio ambiente. É dessa experiência que extraio as reflexões que compartilho neste artigo.
O artigo 10 da Lei Municipal nº 5.186, de 26 de dezembro de 2019, que consolida a legislação ambiental de Itabira, estabelece a composição paritária do CODEMA: 12 representantes do poder público e 11 da sociedade civil.
Dentre os 12 representantes do poder público, um é o secretário de Meio Ambiente, que, por força da lei, preside o conselho e só vota em caso de empate. Já entre os 11 da sociedade civil, temos:
• Representantes de clubes de serviço, como o advogado Glaucius Bragança (Loja Maçônica) e Sidnei Lage (Rotary Club), este último enquadrado como defensor dos interesses dos moradores;
• O Sindicato Metabase representa os trabalhadores;
• O Sindicato Rural representa os sindicatos patronais;
• A ACITA representa as associações de classe econômica;
• A OAB, como associação profissional;
• A FUNCESI, representando instituições de ensino superior;
• A Belmont, como representante do setor minerário;
• A Interassociação de Bairros e o Rotary, como entidades civis ligadas aos moradores;
• A Cáritas Diocesana, como entidade ambiental;
• A HR Domínio, representando incorporadoras e loteadoras;
• E, por fim, a própria Vale, com cadeira cativa.
É preciso reconhecer: Itabira vive uma angústia estrutural. Paira sobre a cidade a incerteza do que virá quando a mineração cessar — ou se reduzir drasticamente. Por isso, é urgente reativar com seriedade o grupo de trabalho sobre o Fechamento de Mina, criado no próprio CODEMA. E mais: a falta de respostas dos órgãos oficiais a perguntas feitas a eles não pode ser tratada como normal. Deve ser denunciada em todos os fóruns possíveis.
A reunião da sexta-feira, 11 de abril de 2025, teve como protagonistas dois conselheiros da sociedade civil. De um lado, o representante da Cáritas Diocesana, que defendeu um produtor rural itabirano diante de inisistentes ofertas da Vale para comprar seu terreno. De outro, o representante do Rotary, que, em tom enfático, afirmou que o CODEMA “é para defender as empresas”. A pergunta que surge é inevitável: essas falas representam de fato as entidades que eles ocupam? Ou estamos diante de posições pessoais travestidas de representação institucional?
Outra reflexão importante: faz sentido que a Vale tenha cadeira própria no CODEMA ao lado de outra empresa do mesmo setor? Em conselhos de recursos hídricos, por exemplo, a composição é feita por três segmentos distintos: poder público, usuários e sociedade civil. Esse modelo ajuda a evitar distorções de representatividade. Seria exagero afirmar que o CODEMA “é das empresas”. Mas quando empresas ocupam cadeiras como se fossem sociedade civil, a percepção pública pode ser exatamente essa — e com razão.
No caso específico da Vale, sua presença constante desde a fundação do conselho, e sua influência histórica na cidade, criam um dilema: sua exclusão parece antinatural, ou até contraprodutiva para o conselho, mas sua presença precisa ser revista com critérios claros de equilíbrio e legitimidade.
Essas provocações são necessárias. O que se busca aqui é o fortalecimento do CODEMA enquanto espaço legítimo de deliberação ambiental. Um conselho qualificado, representativo e efetivo é essencial para o futuro de Itabira — uma cidade que precisa, urgentemente, pensar para além da mineração.
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