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06 May 2025
SIMULADOS DE ACIDENTES COM BARRAGENS DE MINERAÇÃO

POR QUE AINDA RESISTIMOS A SIMULADOS DE EMERGÊNCIA? O CASO DE ITABIRA
• Denes Lott
Na tarde de ontem, 23/04/2025, a cidade de Itabira participou de mais um simulado de emergência envolvendo barragens de rejeitos, promovido pela Defesa Civil Estadual, pela Defesa Civil Municipal e pela mineradora Vale. O exercício — sirenes soando, moradores sendo orientados, rotas de evacuação testadas — deveria ser encarado como avanço na gestão de riscos.
No entanto, o que se viu em muitos grupos de redes sociais e WhatsApp foi o oposto: zombarias, críticas, lamentações. Alguns internautas, inclusive, invocaram versos de "Deus lhe pague", de Chico Buarque, para ilustrar o desconforto emocional que o simulado despertou.
Esse tipo de reação revela um traço preocupante: a falta de uma cultura prevencionista sólida em nosso meio. Em vez de encarar o treinamento como um ato de responsabilidade coletiva, parte da população o percebe como algo pesado, esquisito, um mau agouro — como talvez, e o simples fato de simular fosse capaz de atrair o acidente.
Simulados: Para que servem?
Simulados de acidentes são exercícios planejados para treinar a população e as instituições públicas na resposta a situações de alto risco — como o rompimento de barragens, acidentes nucleares ou desastres industriais.
No Brasil, destacam-se:
-Simulados obrigatórios em barragens, conforme a Lei nº 12.334/2010 (Política Nacional de Segurança de Barragens).
-Exercícios em usinas nucleares de Angra, com evacuação programada de milhares de pessoas.
-Treinamentos em plataformas e refinarias da Petrobras, seguindo o Plano Nacional de Contingência.

Em países como o Japão, Alemanha e Estados Unidos, simulados são práticas rotineiras, celebradas como demonstrações de cidadania e responsabilidade social.

A RESISTÊNCIA CULTURAL E A BAIXA ADESÃO: NEGAMOS O QUE NOS ASSUSTA
Embora não seja minha área de formação, conceitos estudados na psicologia comportamental ajudam a iluminar o que observamos socialmente.
A chamada evitação experiencial, conforme descrita por Hayes et al. (1996), explica a tendência humana de evitar qualquer situação que confronte medos profundos — ainda que essa fuga nos torne mais vulneráveis.
Em outras palavras: zombar de simulados, ignorá-los ou tratá-los como "mau agouro" é, muitas vezes, uma defesa emocional contra a ansiedade que o risco real provoca.
Essa resistência emocional tem um reflexo prático dramático: a baixíssima adesão da população aos simulados.
Em Itabira, como em tantas outras cidades mineradas, a quantidade de moradores que efetivamente participa, que se desloca aos pontos de encontro, que leva o exercício a sério, é mínima — muitas vezes, inferior a 10% da população prevista.
Isso compromete gravemente a eficácia dos simulados.
Sem a participação comunitária, os exercícios perdem seu sentido, transformando-se em meras formalidades institucionais.
Prevenção sem povo é ficção.
Simulado sem adesão é apenas encenação para auditoria.
Mudar esse quadro exige não apenas divulgar o risco, mas educar para o risco — ressignificar o próprio valor da preparação.
A atuação da Fundação Israel Pinheiro (FIP) merece aplausos pela divulgação do vídeo sobre o exercício simulado de ontem no Instagram. A Fundação Israel Pinheiro (FIP), atua como assessoria técnica independente aos atingidos e desempenha um papel fundamental na mobilização e conscientização da comunidade buscando engajar a população e reforçar a importância da participação ativa nesses exercícios.

Conclusão: Preparar é um dever, não pode ter uma conotação de mal presságio ou antipática, que gere resistência
Não treinar por medo de assustar é como recusar o colete salva-vidas achando que ele atrairá o naufrágio.
Que os simulados sejam cada vez mais realistas, frequentes e respeitados.
Que a adesão comunitária deixe de ser exceção e passe a ser a regra.
Que o medo inevitável nos impulsione à ação — não à zombaria.
E que Itabira avance, não apenas organizando simulados, mas cultivando verdadeiramente uma cultura viva de segurança, com a participação consciente de todos.

Denes Martins da Costa Lott
Advogado especialista em Direito Ambiental e Minerário. Secretário da Comissão de Meio Ambiente da 52ª Subseção da OAB. Ex Secretário de meio ambiente de Itabira.

Referências:
Lei nº 12.334, de 20 de setembro de 2010. Estabelece a Política Nacional de Segurança de Barragens.
Hayes, S. C., Wilson, K. G., Gifford, E. V., Follette, V. M., & Strosahl, K. (1996). Experiential avoidance and behavioral disorders: A functional dimensional approach to diagnosis and treatment. Journal of Consulting and Clinical Psychology, 64(6), 1152–1168.
ONU. (2015). Marco de Sendai para Redução do Risco de Desastres 2015-2030.


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